De
novo é a juventude que dá início ao que parece ser mais um prolongado processo
de mudança no Brasil. Seja, embora, o dinheiro da corrupção e da manipulação incalculável, apenas 20
centavos de um reajuste na tarifa de transportes serviram de estopim para
detonar a bomba de efeito retardado que se consumia em fogo lento na mentalidade
esparsa da opinião pública brasileira.
Os
governantes estavam talvez esquecidos do quanto é brutal pagar três reais por
uma tarifa de transportes num país em que o salário mínimo não chega a R$ 600.
Destinaram R$ 30 bilhões para a construção superfaturada de arenas de futebol,
seguindo o eterno ensinamento do pão e circo – no caso muito mais circo do que
pão – de Maquiavel, sem ouvir o que estavam “sussurrando pelas alcovas”,
“cantando em versos e trovas” a cada vez que, inutilmente, um cidadão precisava
de hospital; a cada vez que um plano
de saúde mandava alguém de volta da porta do
consultório.
A
propaganda de um paraíso em desenvolvimento, conscientemente paramentada pelos
efeitos dos programas sociais, confronta-se com a violência diária e
ininterrupta dos assaltos que só a miséria consegue proporcionar. A educação
privatizada e a saúde privatizada, imediatamente substituíram as tarifas de
transportes nas faixas e cartazes que o povo levou para as ruas. E foram os
meninos rebelados das redes sociais que deram início a esse monumental protesto
que se espalhou pelo país. Do inconsciente dos que mal sabiam o que estavam
fazendo, brotou a consciência coletiva que veio dizer um basta à manipulação das
massas e à corrupção.
Os
mesmos meninos de sempre. Eles, que em outros tempos foram às praças pedir o fim
da ditadura militar, que exigiram eleições diretas pintando os rostos de verde e
amarelo, estão de volta. Agora para dizer que o dinheiro da corrupção basta para
que tenhamos transporte público de qualidade; basta para por fim à
visão grotesca de pacientes gritando nos corredores dos hospitais; basta para
vencer o analfabetismo e a pobreza absoluta.
A
liberdade os construiu. Com o fim da censura, as notícias de que estão roubando
até a merenda escolar das crianças chegam às suas casas pela TV e amanhecem em
seus computadores. Eles vêem, ouvem e são tomados da mesma indignação que em
outros tempos serviu para mudar o país. São apartidários
sim , mas não são apolíticos. Ninguém o é.
Sabem
que ladrão de dinheiro público quase nunca vai preso ou fica muito pouco tempo
na prisão no Brasil. E estes abusaram do poder. Transformaram o país na
República dos conchavos e das negociatas. E o misto de paz e revolta com que
hoje ornamentam a democracia brasileira é um prêmio ao
estado de direito corroído por tiranos e corruptos e uma esperança renovadora
para o futuro desta Nação.